A vida
simples do homem do campo é com frequência colocada à prova por pessoas que, de
olho no lucro das propriedades rurais, têm se especializado em aplicar golpes,
lesando milhares de produtores no Estado. Preços acima do comum e vantagens que
as empresas normalmente não oferecem são alguns dos atrativos usados para
atrair agricultores para armadilhas. A ingenuidade e o sentimento de confiança
do povo do campo acabam facilitando a aplicação de golpes.
No
Noroeste, um caso investigado pela Delegacia de Polícia de Santo Ângelo teria
feito mais de 300 vítimas. Entusiasmados com o valor extra de R$ 0,03 por litro
de leite, oferecido por um homem que se dizia intermediário de uma empresa,
agricultores de municípios da região ficaram sem receber pelo produto entregue.
O
prejuízo – a ação se desenrolou ao longo de meses, em diferentes cidades – é
estimado em cerca de R$ 12 milhões pelo delegado de polícia de Santo Ângelo,
Heleno dos Santos.
– Os
produtores não têm documento, cadastro ou contrato que oficialize a transação.
Muitas vezes, o caminhão que busca o leite muda, e mesmo assim, entregam o
produto sem questionar – afirma o titular da DP.
Muitos
casos sequer são comunicados à polícia. O produtor Edson Becker, 45 anos,
amarga um prejuízo de R$ 7 mil, por 9 mil litros de leite que entregou sem
receber pagamento. Ainda assim, não registrou ocorrência, na esperança de que a
situação venha a ser resolvida:
–
Entreguei uns três meses e pagaram certo. Daí em diante, não consegui mais
receber – conta Becker, de Boa Vista do Cadeado.
Para quem
vive da produção leiteira de 18 vacas, o rombo no caixa é considerável. Há dois
meses, o único sustento da família de Becker vem do cultivo de morangos. Tudo o
que o agricultor tem para provar a relação comercial é uma caderneta com a
assinatura do transportador que retirou o leite da propriedade.
– Foi no
fio do bigode – conta Becker, explicando que confiou na proposta do golpista.
Outro
golpe frequente é o da compra de gado. O diretor jurídico da Federação da
Agricultura do Estado (Farsul), Nestor Hein, recebe semanalmente consultas de
sindicatos do Interior, contando situações semelhantes, em que ao final, o
produtor acaba lesado:
– Há
aventureiros no Interior que alugam plantas frigoríficas, pagam bem pelo gado
no começo para preparar o golpe e, depois, compram lotes muito grandes e
desaparecem.
Ao tentar
cobrar pelo produto entregue, o criador descobre que o escritório fechou e os
telefones não atendem mais.
Também
são comuns golpes envolvendo a venda de equipamentos agrícolas com descontos
improváveis e preços de barbada, que igualmente trazem perdas significativas
para o produtor rural.
Outro
problema são os cheques sem fundos usados na compra de frutas, ovos e outros
produtos.
Apesar de
ser uma forma de proteção, a orientação de comprar de quem tem tradição e é
confiável nem sempre funciona. Conforme o coordenador-geral da Federação dos
Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul do Brasil (Fetraf Sul),
Celso Ludwig, milhares de produtores filiados a cooperativas ou que trabalham
sob forma de integração com frigoríficos de suínos e aves também são vítimas da
má gestão. Muitas vezes, esses casos provocam quebradeira em propriedades e têm
consequência direta na economia dos municípios.
Em caso
de dúvida, o indicado é sempre procurar a orientação de sindicatos, advogados e
registrar os casos em uma delegacia de polícia.
– O
produtor não pode acreditar em ofertas mirabolantes e deve pedir orientação
antes de fazer negócios – alerta Hein.
Produtor
entra na Justiça para reaver dinheiro
O
produtor Valdir Tonon, de Cruz Alta, foi lesado em mais de R$ 30 mil por um
intermediário que comprou e não pagou pela produção leiteira. Agora, espera
conseguir reaver na Justiça os valores a que tem direito. Como ele, cerca de
300 produtores da região noroeste do Estado caíram no conto do atravessador,
que comprou o leite, mas não repassou o dinheiro aos produtores.
Proprietário
de 40 vacas leiteiras, Tonon costuma fazer tudo certinho: tira nota e sempre confere
para quem está vendendo. Mas, desta vez, nem a precaução adiantou.
– Eles se
apresentaram como sendo de uma indústria paulista, eu investiguei e a empresa
era idônea, com mais de 50 anos no mercado. Só que no final, tinha um
atravessador que vendeu o produto e embolsou o dinheiro – conta.
Foram 53
mil litros de leite perdidos pelo produtor que, atraído pelo preço alto,
entregou o fruto de dois meses de trabalho. Numa audiência na Justiça de Cruz
Alta, o intermediário se propôs a pagar o atrasado em parcelas se o produtor
voltasse a entregar o leite.
– Aprendi
a lição, vou desconfiar sempre – explica Tonon.
A cautela
como aliada
Desconfie
de propostas com preços muito diferentes da média dos oferecidos, ofertas muito
boas, ou negócios fáceis.
Combine a
venda, exija que seja feita por meio de contrato e com nota no momento da
retirada do produto.
Certifique-se
quando for convidado a ser avalista ou fiador, tanto em operações individuais,
de agricultor para agricultor, quanto de ações cooperativadas, que a ação tenha
sido aprovada em assembleia e que permitam levar o documento para análise de um
advogado.
Verifique,
em caso de trabalho sob o sistema de integração, se a empresa se responsabiliza
por restituir o investimento em caso de quebra de contrato nos casos em que são
exigidas obras de modernização nas instalações.
Assegure-se
de que a cobertura de apólices de seguro esteja sempre expressa no contrato.
Envie
contratos para um advogado ler antes de assiná-lo e busque orientações no
sindicato local, que costuma oferecer gratuitamente esse tipo de serviço.
Procure a
polícia se desconfiar que existe algo de errado na negociação.
Fontes:
Fetraf/Sul, Farsul e delegado Heleno dos Santos
Matéria: ZERO
HORA
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